Com Alan Ladd, Jean Arthur, Van Heflin. 1952. 113 min
Dois planos sequência - um no princípio e outro no fim. O personagem solitário que chega e que parte. No meio fica a história. Similar a tantas outras que alimentaram o nosso imaginário juvenil. E tudo se joga nos pormenores. O olhar dos personagens campo. A matriz ficcional ancorada na história do oeste americano. O jogo desigual entre um latifundiário e meia dúzia de famílias de colonos (do norte da Europa, percebe-se pelos nomes). A paisagem deslumbrante recentemente colonizada - os índios já estavam mortos ou empacotados em reservas. O sulista claramente deslocado (certamente fugido ao ajustamento de contas pós guerra civil) aceite mas desprezado/gozado pelos outros. A família feliz mas claramente perturbada pela chegada do estranho (o outro que foge completamente aos padrões de normalidade na sobrevivência pela terra). Shane - o outro - vai gradualmente entrando na comunidade e o desejo acontece (não é preciso muitas palavras. A mulher do colono procura nos seus braços a proteção para não pecar) . E as lutas. Violência está sempre associada com o western. Grande pancadaria no saloon, luta entre os dois amigos para "escolher" quem vai lutar com o pistoleiro contratado pelo outro lado e, finalmente, o duelo final para repor a justiça. Shane, vindo de um passado sombrio só adivinhável por pequenos indícios, repõe a normalidade, mas não pode ficar. Marcado pelo passado não pode ficar no céu reconquistado. Sangrando afasta-se definitivamente. Se calhar vai lavar a alma numa praia do Pacífico ou eventualmente cairá na próxima esquia morto à traição por um qualquer pistoleiro. Who cares?
Sendo muito mais denso do que parece, Shane é um daqueles filmes que, de uma forma brilhante, encenou o mito do western e agora cito o Manuel Cintra Ferreira um dos bons malucos da Cinemateca (infelizmente já desaparecido)... trata-se da única mitologia criada pelo cinema, como representação imaginária de uma sociedade primitiva, ao longo dos territórios virgens abertos à colonização.... Estejam atentos. Para lá da trama ficcional repetitiva há outros sentidos a descobrir. Já agora, e mais uma vez, a música quase como um personagem a obrigar-nos a ir para onde o realizador George Stevens queria. A manipular-nos. Mas nós gostamos.
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