12 outubro 2025

Roma Cidade Aberta, de Roberto Rossellini (1945)


"Roma Cidade Aberta" - Roberto Rossellini. C/ Anna Magnani, Aldo Fabrizi, Marcello Pagliero. 98 M. 1945.

1944. Roma ainda está ocupada pelos nazis. A resistência luta de todas as formas e feitios. Diferentes ideias políticas, posições ideológicas contraditórias (católicos versus comunistas), mas união contra o inimigo/ocupante comum a abater. O padre Pietro (Aldo Fabrizi) é um colaborador activo da resistência, portador de mensagens e de apoio financeiro. A Gestapo captura-o e tenta forçá-lo a trair. Resistiu heroicamente. Acabará fuzilado.

História de um militante comunista, membro da resistência, procurado pela Gestapo (Marcello Pagliero) que, acossado pelos alemães, foge de casa em Roma e procura um esconderijo nos arredores da capital. Traído pela namorada, é alvo de uma tentativa de salvação por parte de Pina (Anna Magnani), noiva do seu melhor amigo, Francesco, e pelo padre Pellegrini (Aldo Fabrizi), mas morre torturado pelos alemães.
História de resistência, em certo sentido antecipando o próximo futuro político de Itália - um padre e um comunista aliados numa causa comum.
Anna Magnani, vinda do music-hall, a revelar-se uma actriz de uma densidade dramática arrebatadora - a sequência da sua morte às mãos dos nazis é das mais prodigiosas na obra de Rossellini. Ganhou o passaporte para Hollywood. Onde fez coisas importantes.

"Roma Cidade Aberta" é considerado um dos marcos inquestionáveis da história do cinema formando, juntamente com "Paisà - Libertação" e "Alemanha, Ano Zero", a chamada Trilogia da Guerra de Rossellini. Os manuais e as revistas de cinema dos anos 50 estão cheios de artigos e discussões mais ou menos académicas sobre o filme e o chamado neorealismo. Muitos atribuem a "Roma Cidade Aberta" o início daquele movimento estético, artístico e cinematográfico. Na verdade, dois anos antes, Visconti tinha feito o seu primeiro filme, "Obsessão", a partir do livro policial americano "O Carteiro toca sempre duas vezes" e é mais ou menos consensual que foi o primeiro filme neorealista. Mas é um facto que o filme de Rossellini constituiu uma espécie de separação entre um antes (o cinema fascista de Mussolini, escapista e propagandístico) e um depois (a dessacralização do cinema, uma forte influência documental, secura narrativa, a representação crua e realista das dificuldades económicas e sociais da época, com sets de filmagem reais, muitos actores não profissionais e temas duros, reflectindo as dificuldades das pessoas no caos de destruição da guerra - pobreza, desemprego, miséria...).

Depois de acontecimentos mais ou menos bizarros, o filme foi totalmente ignorado aquando da estreia, depois começou a captar alguma curiosidade intelectual e, quase por um passe de mágica, estreou nos EUA (o primeiro filme italiano após a guerra no mercado americano). Espantosamente foi um sucesso. A partir daí é outra história.

Mas Rossellini tem como cineasta uma história um pouco nebulosa. Em jovem tinha feito umas curtas metragens e  três filmes de guerra para o poder fascista que, independentemente, de argumentos mais ou menos elegantes mais ou menos forçados, foram instrumentos ideológicos do poder fascista. 

Depois de "Roma Cidade Aberta" a sua carreira esteve longe de ser linear. Mantendo sempre uma linha estética de cinema pobre, apostando na autenticidade, acabou, por opção pessoal a fazer filmes para a televisão com uma forte incidência em temas e personagens cristãos. Pelo meio - durante sete anos - houve a história amorosa e cinematográfica (escandalosa) com a Ingrid Bergman. Quando ela regressou ao star system glamouroso de Hollywood, com cinco filmes de Rossellini no currículo ("Stromboli", "Viagem a Itália" e "Europa 51"...), um divórcio e três filhos para sustentar, Rossellini continuou na Europa fazendo cinema pobre, simples e cristão. A televisão foi o seu meio privilegiado.

Jean-Luc Godard, na sua juventude de crítico de cinema, escreveu "Todos os caminhos levam a 'Roma Cidade Aberta". Já passaram umas boas dezenas de anos e só podemos concordar e, mais uma vez,  deixarmo-nos enredar pelas suas personagens, lugares e situações. O padre Pietro é para mim um exemplo notável de crente nos homens, apesar de todos os pecados.
O Papa Francisco considerava este filme um dos seus favoritos. A propósito, será que a Igreja tem papa depois da sua morte? Não se dá por ele.

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