01 janeiro 2024

Shine - Simplesmente Genial, de Robert Scott Hicks (1996)

Com Geoffrey Rush, John Gielgud. 1996. 120 min

A genialidade e a loucura. Ou vice-versa. A história é bem real e é nossa contemporânea. Um pianista australiano de setenta e tal anos que, segundo a Internet, está atualmente a fazer uma digressão de fim de carreira por alguns países da Europa. Parece normal, mas não é. A genialidade foi aprisionada pela loucura e não há saída. Nunca se sabe o que esperar. O filme bem o enuncia. É a história de David Helfgott, menino-prodígio do piano a quem a vida correu mal (a Mozart, com o mesmo percurso inicial, as coisas correram bem, para nosso incomensurável prazer). Quando tudo indiciava que a geração de 60 iria ter um génio pianista como o Glenn Gould foi a debacle. Rotundo breakdown. Transtorno esquizoafectivo dizem os tratados de medicina psiquiátrica. Antipsicóticos e eletrochoques para cima do pobre. E depois, ao fim de muitos anos de tratamentos e reclusão, imprevisivelmente, ressuscita. Começa a tocar num bar e a ganhar fama. Até casa em 1984 e, aparentemente, o apoio da mulher deu-lhe o equilíbrio suficiente para renascer. Até agora. Mas, pelos dados recolhidos na ficção deve ser uma relação muito agitada, imprevisível e marxista (calma, refiro-me ao caos dos Irmãos Marx, lembrem-se) para não exagerar.
Ao som de Rachmaninoff, concerto número 3 (considerado pelos exegetas uma das peças de piano mais difíceis da história da música) vamos acompanhando o crescimento e evolução do pequeno e excêntrico prodígio musical (controlado por um pai ambicioso e ditatorial, marcado pelo trauma do campo de concentração a que conseguiu sobreviver) até que tudo se precipitou dramaticamente. Há um antes e um depois. Como há dois atores para o personagem. Quando adulto aterra no corpo de Geoffrey Rush e é para nós espectadores o prazer absoluto (o cinema permite isto: um enorme prazer a assistir à dor mais profunda e inconcebível). Um ator australiano vindo lá do fundo do deserto, que Hollywood e adjacências não mais deixaram escapar. Não são parvos. Para nosso bem. Deram-lhe logo o Óscar. Com justiça.

Só por associação de ideias cinéfilas... nos anos de consolidação do imaginário cinematográfico, Tod Browning, um cineasta enorme das primícias da história de Hollywood fez um conjunto de filmes sobre este universo de alienados mentais, dos quais se destaca o enorme Freaks, uma espécie de bizarro circo de atracções, mas onde o amor acontece. Como aqui. Entrem em cena e deixem-se possuir pela impetuosidade rachmaninoffiana do nosso pianista e pela sua quase angélica postura.

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