01 janeiro 2024

Breve encontro de David Lean

Com Celia Johnson, Trevor Howard. 1945. 86 min

A ponte do Rio Kway" (1957), "Lawrence da Arábia" (1962), " Doutor Jivago" (1965) , "A filha de Ryan" (1970) e "Passagem para a Índia" (1984).

Cinco filmes da nossa memória, pelo menos da maioria de nós. Cinco filmes que entraram no nosso imaginário. Todos foram obra do cineasta inglês David Lean. Obviamente figura maior da história do cinema.

Mas a sua obra vem lá mais de trás. Do tempo da guerra. E em boa companhia. Nesses tempos horríveis ele colaborou com Noel Coward, um dos mais brilhantes artistas ingleses do século XX - dramaturgo, actor, encenador e realizador. Assim, em 1945 (ainda a Europa estava em guerra) conseguiu fazer o seu primeiro filme como realizador, a partir de uma peça de teatro do seu mestre Noel Coward - "Still Life" (1936).

Num quadro de comportamentos repetitivos - de casa para o comboio, do trabalho para o comboio e vice-versa - um homem (médico) e uma mulher (dona de casa) encontram-se numa estação de comboios, conhecem-se, conversam e amam-se. Mas cada um deles é casado, tem filhos e uma vida estabilizada. Aparentemente a vida da mulher até é muito normal e decente.

Casamento versus paixão. Amor e adultério. O desejo e a censura social. Em última instância, a impossibilidade do amor. A melancolia apodera-se dos personagens. A efemeridade é  assunção mútua. Cada um irá para o seu lado. Ela (Laura) retornará para o marido, os filhos e a casa que, na verdade, nunca abandonou (só foi mentindo cada vez mais, com maior risco). Ele (Alec) sairá da história da forma mais britânica que se pode imaginar - vai (foge ao destino) para uma colónia africana do Império Colonial Inglês. Leva a mulher e os filhos e vão certamente beber muitos gins, jogar cricket e contribuir ativamente para o status quo do Império. Só iria durar mais vinte anos, como sabemos.

Muito bem articulada a matriz da ficção. Umas sequências iniciais (que correspondem ao encontro final entre os dois amorosos) e longos flashback numa espécie de diálogo interior da mulher como se contasse ao marido o caso. E o círculo fecha-se em repetição. Para sempre. A normalidade volta à vida. A fantasia e o sonho não eram possíveis na Inglaterra daqueles tempos.

Ao longo dos encontros na estação a história vai sendo pontuada com uma espécie de intermezzos entre a dona do bar e um ferroviário (uma história de amor pouco clara) que funciona como um contraponto jocoso à densificação crescente da relação entre Laura e Alec.

Melodrama na sua essência. A não celebração do amor intenso pelas mais diversas e, às vezes, incríveis razões.

A história do cinema reserva o seu lugar cativo a este filme. Com razão.

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